sexta-feira, 11 de março de 2011

TEMPO, TRABALHO E PROPRIEDADE

Quando faltam argumentos para os pais, nas discussões com os filhos, eles utilizam dois discursos: o do trabalho e o da propriedade. Ou seja, um deles costuma dizer: "eu TRABALHO e sustento essa casa" ou "essa CASA é minha, quando você morar no que é seu..." Claro que não são só os pais. Estes discursos são utilizados em brigas de casais ou mesmo entre amigos que dividem o mesmo lugar.

Historicamente, o trabalho foi mal visto nas sociedades, era associado a punição ou a tortura. No capitalismo, há o elogio do trabalho e a propriedade individual aparece como símbolo de riqueza. Dahrendorf (apud Masi, p. 82) destaca:

" A educação era orientada como preparação para o mundo do trabalho, o tempo livre como descanso para o novo trabalho, a aposentadoria como recompensa por uma vida de trabalho. Além disso, o trabalho não era apenas considerado necessário para ganhar a vida, mas também como valor em si. Havia um orgulho no trabalho e nas realizações no trabalho. A preguiça era estigmatizada."

Esse mundo não existe mais, porém a ideologia permanece. A base do discurso é o sentimento de culpa: se eu trabalhei o dia inteiro, eu posso tomar um chopp no fim do dia. O trabalho é a referência. Tenho que sofrer primeiro (e muito - o dia inteiro, por exemplo), para ter prazer no final (poucas horas no "happy hour"). Tudo existe em função do trabalho. O tempo livre não existe sozinho. Ele é o intervalo para um "novo trabalho."

Muitas pessoas não precisam trabalhar e trabalham. Por quê? Porque são cobradas. O ócio é criticado. O trabalho ganhou um "valor em si." Isso significa que ele existe mesmo quando não é necessário. Por isso, aliás, as pessoas passam horas dentro de uma repartição pública ou de um escritório fingindo que trabalham. Na verdade, ficam jogando paciência no computador ou navegando na internet ou, pior, gastam o tempo em reuniões para inventar regras (improdutivas) para controlar o tempo dos outros.

Tempo. Eis a palavra chave. Como você "vive" o seu tempo, no "aqui e agora"? "Tempo é dinheiro?" Então as pessoas estão muito pobres, afinal elas não têm tempo para nada...

Os homens, em cada época, definem o conceito de tempo e a maneira correta de usá-lo. O que se vive hoje tem a ver com o capitalismo (não é por acaso que o tempo é associado ao dinheiro). O problema é que vender o seu tempo para o outro seria como vender a sua alma, na medida em que você venderia aquilo que você é. Tempo perdido (ou tempo vendido) é tempo não recuperado. Não se vive o mesmo momento duas vezes. É uma escolha. Abrir mão de viver o "aqui e agora" é simplesmente abrir mão de viver.