quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

POLITICAMENTE CORRETO

Eu não sou viciado em cigarros, bebidas alcoólicas, drogas, sexo, religião ou qualquer outra coisa. Fumo, eventualmente, Cohibas e bebo Jack Daniel's e Heineken. O que eu não suporto é o chamado "politicamente correto", que não é uma lei mas uma "mentalidade" usada por alguns para policiar os outros. Reconheço que isso é mais eficaz do que uma proibição por lei.

De fato, o movimento do "politicamente correto" serve como base para manter ou criar leis que inibem as liberdades dos indivíduos.

Uma vez, um rapaz da Suíça me disse que lá o tráfico era proibido mas o consumo era liberado. Eu perguntei: "como?" Ele disse que quem gostava de fumar maconha, por exemplo, poderia plantar a "cannabis" em casa, para o consumo próprio. Em uma de suas prisões por porte de maconha, Paul McCartney disse que a "cannabis" não fazia mal como os cigarros e as bebidas alcoólicas, o que é verdade.

Nos Estados Unidos, na década de 1920, a lei seca proibiu o consumo de bebidas alcoólicas em todo o país. Resolveu? Não. Foi criado um comércio ilegal e mais indivíduos passaram "a beber em excesso." (William J. Helmer) Se o crime organizado no Brasil foi resultado do contato entre presos comuns e presos políticos na ditadura militar, nos Estados Unidos, foi a partir da proibição das bebidas alcoólicas que o crime organizado ganhou todo o país. A lei seca não deu certo e o consumo voltou a ser liberado.

Este exemplo é usado no debate sobre as drogas. A proibição torna caro o preço do produto e os viciados precisam roubar para poder consumir, o que aumenta os índices de criminalidade. Por causa do tráfico, aumenta também o processo de corrupção de policiais e autoridades governamentais. É criado um ciclo de violência que prejudica sobretudo os cidadãos comuns. Quem viu Tropa Elite 2, percebeu que o problema não é só um caso de repressão policial. Não é também algo localizado, que aconteceria somente num bairro ou numa cidade. Trata-se de um problema internacional. Por enquanto, parece não haver interesse em solucionar a questão e sim usar a luta contra as drogas como um discurso ideológico. Em outras palavras, como não existe mais o fantasma do comunismo, a droga tornou-se a principal causa de todos os problemas sociais.

REACIONÁRIOS

Ted Nugent diz que " se você está na América, deve falar em inglês" - como se essa fosse a língua "natural" daquele território. Ele esquece que antes dos ingleses chegarem por lá, havia índios, assim como em outras terras do continente. Outro erro é referir aos Estados Unidos como "América", como se fosse um único país num único continente. O certo é Estados Unidos da América do Norte - que faz divisa com dois outros países: Canadá e México. Existem ainda a América Central e a América do Sul, com vários países cada uma.

Esse tipo de discurso reacionário é a base da letra de "One in a Million" do Guns n' Roses:

"Police and niggers, that's right

Get out of my way

(...) Immigrants and faggots

They make no sense to me

They come to our country

And think they'll do as they please."

Mais uma vez, o discurso contra os imigrantes, que são tratados como invasores. Axl Rose, em sua música, amplia o seu ódio, atacando os negros, os homossexuais e os policiais. A música encontra-se no CD "Lies". Posteriormente, Rose tentou se justificar e no show em homenagem ao Freddy Mercury, cantou junto com Elton John. Entretanto, parece que não convenceu muita gente.

As agressões contra imigrantes são comuns nos países europeus. Políticos de extrema direita simplesmente defendem a expulsão deles do continente. Recentemente, no Brasil, houve atos de homofobia. A intolerância nem sempre é reprimida adequadamente pelas autoridades, o que acaba servindo de incentivo para outros ataques e manifestações reacionárias seja na música ou em outros meios de comunicação.

A EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Este texto é uma pequena homenagem ao Prof. Dr. Bernard Bernadino, um dos maiores educadores que eu conheci.

Nos oito anos do governo Lula, houve um desprezo quanto à educação. O presidente se elogiava por não ter estudado e ter chegado ao executivo federal. Dizia que não precisava saber línguas estrangeiras, pois era acompanhado de especialistas em suas viagens internacionais. Quando tinha oportunidade, criticava os bolsistas do doutorado, como se eles fossem desnecessários. Além da grande expansão no número de faculdades particulares, houve a dispensa em massa de professores com doutorado e mestrado. Era reforçada a mentalidade de que conhecimento não era importante. O exemplo começava na presidência da República.

O resultado disto tudo será percebido principalmente a longo prazo. Os sinais, contudo, começaram na gestão do presidente petista. Um deles foi o agravamento da indisciplina e da falta de respeito ao professor em todo o país. Em 2009, um professor foi assassinado por drogados, em sala de aula, na frente dos alunos. Em 2010, ocorreram outros casos graves. Em Porto Alegre, um aluno de uma escola técnica quebrou os dois braços da professora por causa de uma nota "C". Em Belo Horizonte, numa faculdade particular - Instituto Isabela Hendrix -, um aluno, que havia sido reprovado, matou um professor com facadas. O docente faleceu dentro da sala de aula.

Em dezembro de 2010, este tema tornou-se pauta do "Profissão Repórter" da TV Globo. Foram citadas várias escolas e depoimentos de diretores, professores e alunos. Numa escola estadual em Florianópolis, em virtude de uma agressão contra a diretora, os professores entraram em greve. Maurício, professor de História, estava bastante desanimado, pois não conseguia controlar os alunos. Só metade, de quem estava na sala, prestava atenção no que o professor dizia e ainda era agredida pelos alunos indisciplinados. Em depoimento, a professora Elizabeth disse que quando pensava em sala de aula, sentia depressão e náusea. E completou: "cansei de remar contra a maré e não volto à sala de aula." Numa escola municipal do Rio de Janeiro, o diagnóstico de outra professora foi de Transtorno Pós-Traumático. O caso era tão grave, que a professora tinha medo de sair na rua. Na sua opinião, além do que os alunos faziam, havia falta de apoio da direção da escola.

Diante deste quadro, uma das primeiras propagandas do governo Dilma foi uma que destacava a profissão e a importância do professor. Auto-crítica do PT? Não. O fato é que ninguém quer ser professor. Como as escolas e faculdades funcionariam sem os professores? O que os filhos ficariam fazendo enquanto os pais estão trabalhando? Eles vão para as escolas... mas... e se não existirem professores? Pior: com a desqualificação da profissão, qualquer um poderia entrar na sala de aula e se apresentar como "professor" - sem ter formação adequada. Já imaginou? Além da violência e do erotismo que aparecem na TV, os filhos estariam entregues diariamente, nas escolas, nas mãos de profissionais sem qualificação. Três "aparelhos" (como diria Althusser) básicos na formação do cidadão: a família (ausência dos pais), a escola e os meios de comunicação, sobretudo a TV... dá para imaginar o resultado? Se, hoje em dia, as pessoas reclamam que não existe mais respeito à autoridade e o que se vê é uma violência absurda no cotidiano, o que ocorrerá daqui alguns anos, quando as crianças e os adolescentes desta geração chegarem à vida adulta? Assustador? "Welcome to the future..."

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

AS INVASÕES BÁRBARAS

No filme "Les Invansions Barbares", um professor universitário é afastado por causa do câncer. No hospital, ele reclama que o reitor no foi despedir dele. Na sua última aula, era clara a indiferença dos alunos.

Para piorar, numa discussão com o filho, o velho professor tem que ouvir a seguinte crítica: "... o que é melhor que mofar em uma universidade medíocre em uma província atrasada." Para quem trabalhou tanto tempo em duas faculdades do interior, como foi o meu caso, trata-se de uma crítica e tanto.

Em suas reflexões, ele afirma que sentirá saudades sobretudo dos livros e das mulheres. Arrependimento? Ele diz que gostaria de ter escrito livros. Esse é um problema do professor de faculdade pequena: ele tem que dar muitas aulas e atividades como pesquisa e extensão não são valorizadas. Em resumo, ele torna-se uma "máquina repetidora de conhecimento", que vende o seu tempo em troca do salário. Normalmente, ele usa isso como desculpa para não produzir. É uma desculpa interessante, se pensarmos as condições de trabalho que ele tem. No entanto, não deixa de ser uma desculpa.

Obviamente, me identifiquei com a história do professor do filme. Existem pontos comuns e divergentes. Apesar das faculdades não valorizarem, eu fiz duas teses, publiquei seis livros e escrevi artigos para revistas científicas. Produzi algo. Existem falhas nos trabalhos, reconheço, mas isso acontece com todos. O que importa é que arrisquei e publiquei. Arrependimento? Conscientemente, nenhum... Hoje em dia, costumo dizer que trabalhei tempo demais (a tal ideologia do trabalho...). Não sei, contudo, se isso seria um arrependimento.

O comum é ouvir perguntas sobre quando voltarei a dar aulas. As pessoas não acreditam que você possa viver sem estar associado a uma empresa ou instituição. Por quê não? Não sei se voltarei a dar aulas. Quando surge esse assunto, digo que sou formado para ser professor e pesquisador, ou seja, dou aulas, pesquiso e escrevo. Das três coisas, atualmente, só não trabalho em sala de aula.

Nas reuniões que participava como docente, era comum ouvir gente dizendo que gostaria de ter tempo para ler e escrever, sem se preocupar com o cumprimento de horários e com o cartão de ponto. Hoje eu tenho esse tempo. E leio e escrevo.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

BENS MATERIAIS

Quem nunca viajou para o exterior, não entrou, por exemplo, no Coliseu de Roma, não entende por que uma pessoa gasta tanto com uma viagem ao invés de trocar de carro ou obter outro objeto da moda. A mesma lógica persegue aquele que não fez um curso superior. Costuma dizer: "de que adianta fazer uma faculdade, se o indivíduo ganha tão pouco depois?" Normalmente, este tipo de pessoa trabalha em excesso para adquirir os seus bens materiais. Com eles, se julga superior àquele que estudou, viajou e adquiriu cultura. De fato, não entende o conceito de cultura. Acha que seria algo inútil.

"Educação, para quê? Eu ganho mais do que esses médicos por aí..." Alguém já ouviu isso ou algo parecido? "A educação quer dizer enriquecer as coisas de significados." (Dewey, apud, Masi) Em outras palavras, as coisas não são riquezas. Elas são meios. A utilidade de uma coisa acaba no momento em que se adquire algo melhor. Os objetos são descartáveis. Assim, qual seria o sentido de acumular bens materiais? A pessoa trabalha em excesso para possuir mansões, carros, iates, aviões e... daí? A noção de posse é ilusória. O indivíduo não é dono dos objetos e nem do seu próprio corpo. Como dizem, "após a morte, ele não leva coisa alguma."

Então, para quê desperdiçar o tempo da vida em atividades inúteis para comprar coisas que a pessoa não precisa e que - mesmo nesse ponto de vista - não podem ser efetivamente dela? Ideologia. Ela acredita no que vê. Ela quer ser como a maioria. Ela não quer problematizar a sua condição humana e aproveita o discurso hegemônico da sociedade para fugir dela mesma. Ela teme tanto a morte que esquece de viver o presente. Não olha para o passado, pois tem medo de lembrar o que aconteceu. No máximo, ela olha o passado como enxerga o presente: de forma ilusória, ou seja, o que era fracasso é visto como vitória, o que era dor é amenizado ou omitido. Ela diz que vive o cotidiano, mas está sempre ocupada, não tem tempo para ela mesma. Ela sempre corre... para onde? Ela foge... do quê? Refletir? Não existe tempo para isso. Ela acredita que o importante é só aquilo ela vê. Esquece que um dia, aquilo que a representa com um "ser material" - o seu corpo - necessariamente desaparecerá.